A promulgação da Lei nº 14.344, de 24 de maio de 2022, conhecida como Lei Henry Borel[1], representa um avanço significativo na legislação brasileira no que diz respeito à proteção das crianças e adolescentes contra a violência doméstica e familiar. Antes dessa importante medida, o enfoque principal recaía somente sobre vítimas mulheres nesse contexto, em razão da Lei 11.340/2006, a Lei Maria da Penha.
A Lei Henry Borel alinha-se com os princípios estabelecidos pela Lei Maria da Penha, reconhecendo que crianças e adolescentes, assim como as mulheres, também podem se encontrar em situação extremamente vulnerável em contextos domésticos e de relações familiares. Sob essa ótica, a nova legislação define como violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente qualquer ação ou omissão que lhes cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual, psicológico ou dano patrimonial.
Essa definição abrangente inclui diversas situações, tais como agressões físicas ou verbais, abusos sexuais, negligência, exposição a ambiente de violência, entre outras formas de violência que possam ocorrer no âmbito do domicílio, da residência, ou em outra relação doméstica e familiar. Dessa forma, o contexto “doméstico e familiar”, assim como na Lei Maria da Penha, contempla não apenas a estrutura física do lar, mas também as relações interpessoais que o permeiam.
A Lei Henry Borel institui medidas protetivas de urgência específicas para crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica e familiar. Até meados de 2017, era possível estender medidas concedidas em favor da mãe, obrigatoriamente a vítima, aos filhos menores de idade. Em 2017, a Lei nº 13.431/2017 – que versa sobre garantias à criança e ao adolescente vítima ou testemunha de violência – inseriu no ordenamento jurídico, ainda que genericamente, a possibilidade da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência pleitear medidas protetivas contra o autor da violência. Mas o fato de haver, agora, medidas protetivas específicas para tais vítimas em tal contexto é um avanço significativo, em garantia da segurança e do bem-estar desses indivíduos.

Dentre as medidas protetivas previstas na legislação, estão a suspensão da posse ou restrição do porte de armas que o agressor eventualmente detenha; o afastamento do agressor do lar ou do domicílio; a já conhecida proibição de aproximação e contato com a vítima; a restrição de frequência a determinados lugares e a suspensão de visitas, sobretudo em casos em que o agressor é genitor da vítima. Além dessas medidas, a Lei Henry Borel também prevê a prestação de alimentos provisionais, o comparecimento a programas de recuperação e reeducação, bem como o acompanhamento psicossocial por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio.
Em suma, a Lei Henry Borel representa um marco na proteção dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes. Ao reconhecer a vulnerabilidade desses indivíduos e estabelecer medidas específicas para sua proteção também em ambientes domésticos e familiares, a legislação reafirma o compromisso do Estado em garantir um ambiente seguro e harmônico para o seu desenvolvimento.
[1] Nome em homenagem à criança de quatro anos que faleceu em abril de 2021, sob fortes suspeitas de maus tratos e violências perpetradas em ambiente doméstico e familiar.